Lixivia (i)mundi
Fernando Fuão
I
Nos Galpões de reciclagem comecei a entender o processo de apodrecimento do (i)mundo com seus rejeitos, suas embalagens, suas superficialidades, a recente “industria exploratória” da reciclagem que se formou, a negligencia, e a absoluta incapacidade economica do Estado, dos Municipios em gerenciar o lixo produzido pela sociedade, os tristes acordos silenciosos e coniventes entre catadores e Municipio, a recusa do Estado em reconhecer o trabalho feito pelos catadores, (sem uma legislação trabalhista que regulamente a profissão, e que defina parâmetros mínimos de equipamentos de proteção individual e de sistemática na produção). Acabei por observar que o caminho do lixo é a ladeira da autoestima. Vi que os galpoões de reciclagem e carrinhos dos catadores são os lugares ultimos que a pobreza se lança de corpo e alma em busca de seu alimento diario.Vi o carrinho como esperança, esperança de uns miseraveis tostões para a sobrevida.
Vi a mesa de triagem como uma porta solução para um trabalho digno ainda que sujo.
Vi alguns carrinhos cheios de esperanças, mas também a tristeza estampada em muitos rostos, os pés dilacerados de tanto andar. Nesses espaços encontrei “tudo de ruim”: o lixo do (i)mundo, e entretanto, uma riqueza humana tão grande, “humana demasiada humana”. Afora algumas celeumas descobri a solidariedade que costuma acompanhar a pobreza, pude observar a realização do antigo sonho das cooperativas e associações autogestionáveis dos anos 60-70, mas agora esvaziadas de qualquer conteudo politico social.
A maioria deses grupos, coletivos, associações que vivem da triagem só pensam na melhoria dos ganhos, dos ganhos individuais não preocupando-se com o coletivo, com motivos reais.
Descobrimos a vida nua. Mais que nua, a vida suja que está por trás da exploração dos catadores: a podridão do poder, a sujeira das representações de todo tipo, o nauseabundo cheiro do lixo produzido pela sociedade que vai parar nas mesas de triagem. Nelas encontrei as embalagens de pizzas, cheetos, ruffles, embalagens de chocolate, latinhas de coca-cola, todo tipo de lixo gostoso que entope nos veias e nos embota a cabeça de meleca, misturadas com seringas com sangue, coco de gateaux, papel higienico e toda sorte de lixo que nem podemos imaginar. A história do que se encontra poderia virar um museu de curiosidades. Assisti as brigas diarias, entre eles, as sacanagens, os pequenos roubos, as festas, os aniversarios….enfim, a microfisica do poder em toda sua visibilidade, .
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